18/04/2013

Deletar dados pode resfriar computadores




Os cientistas acreditam já haver condições para testar o resfriamento quântico, principalmente agora que já existem supercomputadores quânticos no mercado, como o .[Imagem: D-Wave]
Conhecimento e falta de conhecimento
Seja o seu notebook esquentando os seus joelhos, ou um supercomputador esquentando uma sala inteira, a ideia de que os computadores geram calor é familiar a todos.
Mas um grupo de físicos teóricos acaba de descobrir algo surpreendente: os processos computacionais não são capazes apenas de gerar calor; sob certas condições, eles podem ter um efeito contrário, de resfriamento.
Por trás dessa constatação estão considerações fundamentais relativas ao conhecimento e à falta de conhecimento – clássico e quântico.

Quando os computadores computam, a energia que consomem eventualmente acaba por se transformar em calor. Isto não se deve unicamente à engenharia do computador – a física tem algo a dizer sobre os fundamentos do custo energético do processamento da informação.
A nova pesquisa revela uma surpresa justamente neste nível fundamental.
Deletar dados para esfriar o computador
O grupo demonstrou que deletar dados, sob determinadas condições, pode criar um efeito de resfriamento no computador, ao invés de gerar calor.
O efeito de resfriamento aparece quando se leva em conta o estranho fenômeno quântico do entrelaçamento (ou emaranhamento).
Em última análise, pode ser possível aproveitar esse efeito para resfriar os supercomputadores, que estão com seu aumento de desempenho travado pela geração excessiva de calor.
“Alcançar o controle no nível quântico, que será necessário para implementar isso em supercomputadores, é um enorme desafio tecnológico, mas pode não ser impossível. Nós temos visto um enorme progresso nas tecnologias quânticas nos últimos 20 anos,” afirma Vlatko Vedral, da Universidade Nacional de Cingapura.
Com a tecnologia disponível nos laboratórios atuais de física quântica, já deve ser possível fazer um experimento para prova de conceito usando alguns poucos bits de dados, sugere Vedral.
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O observador é representado por uma máquina com uma memória quântica (Q), que irá deletar um qubit S, usando uma condição de temperatura T. O observador pode capturar e coletar o calor (a), guardando-o em uma bateria (c). [Imagem: Rio et al./Nature]
Princípio de Landauer
O físico Rolf Landauer calculou, em 1961, que, durante a deleção de dados, é inevitável alguma perda de energia na forma de calor.
Esse chamado Princípio de Landauer implica que, quando um determinado número de operações aritméticas por segundo for excedido, o computador vai produzir tanto calor que será impossível dissipá-lo.
Nos supercomputadores de hoje, outras fontes de calor são mais significativas do que as previstas por Landauer, mas Vedral e seus colegas acreditam que o limiar crítico no qual o calor de Landauer, gerado pelo apagamento de dados, se tornará importante, poderá ser alcançado dentro dos próximos 10 a 20 anos.
A emissão de calor pelo apagamento de dez terabytes de dados de um disco rígido será, em princípio, menor do que um milionésimo de joule.
No entanto, se esse processo for repetido muitas vezes por segundo, então o calor irá se acumular de forma correspondente.
No novo estudo agora publicado, os pesquisadores vão um passo além. Eles demonstram que, quando os bits a serem apagados estão quantum-mecanicamente entrelaçados com o estado de um observador, o observador pode capturar o calor do sistema ao excluir os bits.
O entrelaçamento conecta o estado do observador ao do computador de tal forma que é possível saber mais sobre a memória do que é possível na física clássica.
Dois conceitos de entropia
Para chegar a esse resultado, os cientistas combinaram ideias da teoria da informação e da termodinâmica sobre um conceito conhecido como entropia.
A entropia aparece de maneiras diferentes nessas duas disciplinas, que são, em grande medida, independentes uma da outra.
Na teoria da informação, a entropia é uma medida da densidade de informação. Ela descreve, por exemplo, quanta capacidade de memória um determinado conjunto de dados irá ocupar quando for comprimido de maneira ótima.
Na termodinâmica, por outro lado, a entropia se refere à desordem nos sistemas, por exemplo, ao arranjo das moléculas em um gás. Na termodinâmica, acrescentar entropia a um sistema geralmente equivale a adicionar energia na forma de calor.
“Nós demonstramos agora que, em ambos os casos, o termo entropia está de fato descrevendo a mesma coisa, mesmo no regime da mecânica quântica,” explica Renato Renner, do Instituto de Tecnologia de Zurique, na Suíça.
Como as fórmulas para as duas entropias têm mesma aparência, já vinha sendo assumido que havia uma conexão entre elas. “Nosso estudo mostra que, em ambos os casos, a entropia é considerada um tipo de falta de conhecimento,” continua Renner.
Entropia negativa
Na medição da entropia, deve-se ter em mente que um objeto não tem uma certa quantidade de entropia por si só – a entropia de um objeto é sempre dependente do observador.
Aplicada ao exemplo de deletar dados, isso significa que, se dois indivíduos excluem dados de uma memória, e um deles tem mais conhecimento desses dados, ele percebe a memória como tendo menos entropia e pode, então, apagar a memória usando menos energia.
A entropia na física quântica tem a propriedade incomum de, algumas vezes, ser negativa, quando calculada a partir do ponto de vista da teoria da informação.
O perfeito conhecimento clássico de um sistema significa que o observador o percebe como tendo entropia zero. Isso significa que a memória do observador e o sistema estarão perfeitamente correlacionados, tanto quanto permitido pela física clássica.
Contudo, o entrelaçamento quântico dá ao observador um “conhecimento mais completo” porque as correlações quânticas são mais fortes do que as correlações clássicas. Isto leva a uma entropia menor do que zero.
Até agora, os físicos teóricos vinham usando essa entropia negativa em seus cálculos sem entender exatamente o que ela poderia significar em termos termodinâmicos ou experimentalmente.
Resfriamento computacional
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O apagamento de 10 terabytes de dados gerará menos do que 1 J, mas o calor irá se acumular se esse processo for repetido muitas vezes por segundo. [Imagem: Rio et al./Nature]
No caso do conhecimento clássico perfeito de uma memória de computador (entropia zero), deletar dados teoricamente não exige nenhuma energia.
Os pesquisadores agora comprovaram que “o conhecimento mais do que completo” do entrelaçamento quântico com a memória (entropia negativa) faz com que a operação de deletar dados seja acompanhada pela remoção de calor do computador e sua liberação como energia utilizável.
Esse é o significado físico da entropia negativa.
Renner salienta, contudo, que “isto não significa que nós possamos desenvolver uma máquina de movimento perpétuo”, o chamado moto-contínuo.
Isto porque os dados só podem ser excluídos uma vez e, portanto, não há possibilidade de continuar gerando energia continuamente.
O processo também destrói o entrelaçamento quântico, e seria necessário suprir energia para repor o sistema em seu estado inicial.
Inovações na termodinâmica
As equações são consistentes com o que é conhecido como a Segunda Lei da Termodinâmica: a ideia de que a entropia do Universo nunca pode diminuir.
“Estamos trabalhando no limite da Segunda Lei. Se formos só um pouquinho mais longe, iremos quebrá-la,” diz Renner.
Estas novas descobertas relativas à entropia na termodinâmica e na teoria da informação podem ter utilidade além de calcular a geração de calor pelos computadores.
Por exemplo, os métodos desenvolvidos no âmbito da teoria da informação para lidar com a entropia poderão levar a inovações na termodinâmica.
De fato, a ligação feita entre os dois conceitos de entropia toca nos fundamentos da física.

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